sábado, 2 de abril de 2011

GRAVIDEZ INDUZIDA

A história do casal que se submeteu à fertilização in vitro e abandonou as três meninas geradas em uma maternidade de Curitiba levantou o debate sobre as normas para a reprodução humana assistida e a necessidade de acompanhamento psicológico às pessoas que fazem esse tipo de procedimento.


O Brasil não possui lei regulamentando a geração artificial de vida. As regras estão definidas apenas em determinação do Conselho Federal de Medicina (CFM), que não estabelece qualquer tipo de norma quanto ao apoio que o casal deve receber diante da probabilidade de gestação múltipla.


Para a psicóloga Maria Virgínia Grassi, os casais que fazem fertilização precisam ser bem orientados durante o processo. “Eles devem saber que podem ter mais de um filho e que isso implica muito mais responsabilidades”, diz. A especialista lembra que não é o fato de desejar um filho que faz o casal ser pai e mãe. “Todo filho – independentemente de ser adotado ou não, gerado por fertilização ou não – precisa ser adotado.


Os pais devem fazer as crianças se sentirem parte da família. É nessa área que entra o trabalho de psicólogos”, afirma. Sobre o casal que teria preferido deixar os trigêmeos na maternidade, a psicóloga supõe que os pais assumiram racionalmente a responsabilidade, mas não emocionalmente.


A diretora da Associação Para­naense de Terapia Familiar, psicóloga Maria Eliza Buzetti Spinelli, sugere que, como a fertilização in vitro foge dos métodos tradicionais, talvez seja necessário restabelecer o vínculo emocional entre pais e criança no caso das trigêmeas. “A emoção foi suspensa de alguma maneira no procedimento”, presume.


De acordo com as especialistas, é necessário ampliar os programas de acompanhamento psicológico e estabelecer critérios mais rigorosos para triagem de quem pretende usar esses tratamentos de fertilização. O presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, Adelino Amaral, diz que as clínicas de fertilização dispõem de assistência psicológica. Fica a critério dos clientes, entretanto, buscar ou não o serviço. “Só há recomendação expressa de acompanhamento quando sentimos que o casal está muito confuso”, explica Amaral lembra que nos casos de fertilização in vitro as gestações múltiplas são mais comuns em relação à inseminação artificial. “Ninguém que recorre à reprodução assistida planeja ter mais de um filho na mesma gestação. Os profissionais da área sabem disso e procuram adotar todos os cuidados possíveis para evitar que essa situação ocorra. Mas há esse risco e todas as pessoas que recorrem à fertilização são informadas de que a probabilidade de gestação múltipla chega a 25%.” Laboratório Estima-se que no Brasil cerca de 20% dos casais em idade reprodutiva enfrentem problemas para engravidar. Por ano, segundo dados da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, são feitas 25 mil fertilizações in vitro no país. A entidade não tem da­­dos sobre a inseminação, mas es­­tima, com base no relato das clínicas associadas, que o volume seja ainda maior. O custo do procedimento gira em torno de R$ 10 mil, mas geralmente são necessárias duas e até três tentativas para que a mulher engravide. Os casais que não podem ter filhos geralmente recorrem a dois métodos: a inseminação artificial e a fertilização assistida. A inseminação artificial consiste basicamente na injeção de espermatozoides no útero da mulher. A inseminação, portanto, ocorre de forma natural e os casos de gestação múltipla são mais incomuns. Já na fertilização in vitro vários óvulos são coletados da mulher e o processo ocorre fora do útero. Depois de fecundado, o óvulo é transferido para o útero quando atinge o estágio de pré-embriões. A chance de sucesso na inseminação é 20% e chega a 40% na fertilização. De acordo com o diretor da Clínica Androlab Reprodução Assistida, Lídio Jair Ribas Centa, a chance da fertilização in vitro gerar múltiplos é maior devido o procedimento usar mais óvulos e embriões. “Os ovários produzem um óvulo no ciclo normal. Na fertilização, você simula o ovário da paciente para ter mais óvulos”, explica. No Brasil, a normatização do CFM estabelece um número máximo de embriões de acordo com a idade da mãe. Dois fatores influenciam os casais a usar mais de um em­­brião. Primeiro, a ansiedade. Quanto mais embriões, mais chance de dar certo. Além disso, a questão financeira pesa bastante. Como o tratamento é caro, se o casal tentar com apenas um embrião a chance de não dar certo e se ver obrigado a tentar novamente existe. No entanto, para refazer o procedimento é preciso pagar de novo. Médico diz que pais estão arrependidos O médico Karam Abou Saab, responsável pela fertilização in vitro que gerou as trigêmeas, afirmou ontem que os pais querem as filhas de volta. A Justiça decidiu retirar a guarda das crianças temporariamente após eles tentarem ficar com apenas duas delas. Um dos bebês nasceu com insuficiência pulmonar. “O casal mudou de ideia. Eles aceitaram as crianças”, disse. De acordo com o especialista, normalmente, os pais recebem a notícia de múltiplos com impacto, mas logo ficam alegres. “Existe um susto inicial. O pai geralmente fica assustado, se preocupa com a parte material, mas depois passa.” A advogada Margarete Moreira, que representa o casal, não quis comentar o caso. Segundo uma funcionária do escritório de advocacia, ela passou o dia de ontem em conversa com os pais dos bebês para definir o que fazer. As trigêmeas nasceram prematuras no dia 24 de janeiro em uma maternidade da capital. Os pais teriam se assustado com o fato e tentaram escolher apenas duas das crianças. O Conselho Tutelar foi avisado e tomou providências na Justiça para evitar que as crianças fossem separadas. Os bebês permaneceram na maternidade durante quase um mês e foram levados, por determinação da Justiça, para um lar de Curitiba, onde estão sob a guarda do estado. Técnicas artificiais surgiram há 33 anos Há 33 anos, o fato de não poder engravidar não é mais barreira para um casal realizar o sonho de ter filhos. Além da opção da adoção, a fertilização in vitro e a inseminação artificial são possibilidades já conhecidas e práticas de muito sucesso na medicina. A jornalista Simone Meireles e o marido queriam apenas um filho, mas a fertilização proporcionou a eles um casal de gêmeos. “Foi natural e muito bem recebido. Ficamos extremamente felizes. Sabia que eram gêmeos desde a primeira ecografia”, conta. Após um aborto natural, ne­­nhum diagnóstico médico conseguiu descobrir os motivos de ela e o marido não conseguirem engravidar. Em 2007, o casal buscou o tratamento. Os bebês nasceram prematuros, permaneceram no hospital por um tempo e logo foram pra casa. “Foi uma emoção indescritível. A partir do momento em que há o embrião dentro de você, o vínculo já se forma. Inclusive, quando os embriões foram implantados, meu marido estava junto. É um momento que simboliza o amor também.” No futuro, quando as crianças tiverem idade para entender o fato, o casal pretende contar como foram gerados. “Encaramos a fertilização como um tratamento de saúde. Não vemos problema nisso e acredito que elas [as crianças] também não vão ver”. Fonte: JL

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